QUANDO O SONHO COMANDA A VIDA
Ao lado da ponte 25 de Abril ergue-se o estádio da Tapadinha. Ele é alto e está lá em cima, à vista do Cristo Rei que lhe abre os braços, na outra margem. Em dias de treino conta com a presença da equipa, dos funcionários e de alguns elementos da direcção. Todos eles estão confiantes e são adeptos de um Clube do qual falam como se fosse um filho, mas que tem já idade para ser seu trisavô. As glórias do actual Atlético Clube de Portugal eram já uma realidade em 1942, ano em que o União de Lisboa, de Alcântara se fundiu com o Carcavelinhos, de Santo Amaro. José Sousa, o “dinossauro”, chegou mesmo a fazer parte da multidão que invadia a freguesia de Alcântara para festejar mais um ano na 1ª. Divisão.
Foi num ambiente amigável que o Jornal do Bairro entrevistou o presidente Adjunto da Direcção, José Almeida Antunes contando também com a presença de outros Órgãos Sociais do Clube, José Sousa do Conselho Fiscal e Quintino Varão, vice-presidente.
Há quantos anos é adepto do Atlético?
Sou adepto há cerca de 30 anos e membro da direcção há mais de 20.
Em que ano é que o Atlético foi campeão de Portugal?
O Atlético nunca, mas o Carcavelinhos foi muitas vezes campeão de Portugal.
Recorda-se de assistir às festas nas ruas de Alcântara, com cabeçudos, para festejar a subida do clube à primeira divisão?
José Sousa – Sim, era um Carnaval autêntico! Andávamos todos mascarados, eu com um chapéu ao alto e todo vestido de preto, haviam verbenas de bailes! Cada vez que o Atlético ganhava havia festa!
Sendo o Atlético um Clube com História, pode referir algum episódio interessante que se tenha passado há alguns anos?
Houveram vários, mas vou-lhe contar uma situação que nem é cómica nem é dramática mas é interessante. Num jogo que disputámos não me recordo com quem, o guarda-redes, que era o Carlos Gomes – que foi também um ícone na baliza do Sporting - tinha a polícia à espera dele para o prender. No intervalo, ele conseguiu sair pela porta do cavalo. Quando acabou o jogo, a polícia andava à procura dele e ele já estava longe daqui, penso que fugiu para Marrocos. Isto foi nos anos 50, ele ia ser preso porque tinha um problema qualquer com uma jovem.
Com estas vitórias o Atlético voltou a ser muito “badalado”, mas já há alguns anos que não vigorava nas páginas dos jornais nacionais…
Depois do Atlético sair da 1ª. divisão, as coisas começaram a ser mais pacíficas e menos faladas. Mas quando estava na 1ª. divisão e até com o Porto houveram vários factos importantes, como a disputa para a Taça, em ’46. Os jogos aqui com o Porto, o Benfica ou o Sporting eram sempre grandes jogos e ainda hoje estamos em 11º., 12º. no ranking nacional de presenças na 1ª divisão…
Passados 60 anos dessa luta pela Taça, derrubaram o Porto na própria casa. Ficou muito surpreendido?
Não, nós próprios e com algum atrevimento almoçámos com a direcção do Futebol Clube do Porto e quando tomámos o café dissemos ao senhor Pinto da Costa que iríamos tratar de o depor. O Torreense em tempos derrotou o Porto e numa sequência lógica nós também iríamos ganhar. Havia alguma coisa que nos dizia que podia acontecer e aconteceu!
Acredita que o campeão estivesse desmotivado por causa da Carolina?
Não… isso passa ao lado dos jogadores e da equipa!
Quantos sócios tem o Atlético?
Cerca de 3 mil e muitos simpatizantes. Nós estivemos no Fórum da Sport TV, em Viana do Castelo. Eles deram-nos os parabéns e pediram-nos uma camisola, enviámos a camisola e na mesma semana, para nossa surpresa, lá estava ele a agradecer ao Atlético, “vocês são os maiores”!
Como é que foi a recepção feita aos vencedores, aqui no estádio da Tapadinha?
Na Mealhada foi uma festa diabólica, com leitão da Bairrada e quando viemos para aqui não podíamos chegar lá acima, isto estava cheio, foi uma festa em que muita gente chorava, foi bonito!
Estas vitórias podem contribuir para melhorar a situação financeira do Clube?
Ligeiramente, mas essas coisas são pontuais. Mas já dissemos que se neste momento todos os clubes acabassem, os sócios do Atlético receberiam dividendos, levavam dinheiro para casa! Os outros de certeza que não.
Para além do futebol, também têm equipas de basquetebol e de futsal. O que tem a dizer sobre estas modalidades?
O basquete também tem as suas tradições, tem muita gente, muitas escolas associadas… Há cerca de 2 semanas estivemos em audiência com o senhor Laurentino Dias, secretário de Estado da Juventude e do Desporto e dissemos que é uma revolta que o Governo não nos ajude com este problema da formação. Não é correcto serem os clubes a substituir o Governo na formação de centenas de atletas de cada clube…
Ao longo de um século de história, já por aqui passaram vários campeões. Acredita que o Atlético volte agora a fazer história?
Acreditar acreditamos sempre, mas essas coisas são muito subjectivas. O Atlético tem condições para ter os pés bem assentes na terra, não dar passos maiores do que as pernas e ir tentando chegar mais além. A segunda liga, que é o escalão que se segue não é nada enquanto não tiver duas zonas, zona Norte e zona Sul. Da forma como as coisas se processam, com 4 séries na 2ª. divisão e em que o vencedor de uma série tem de discutir com o vencedor da outra série a oportunidade de subida é muito primária.
Qual seria então a solução?
A solução era que a 2ª. Liga tivesse 4 clubes para poder subir o campeão de cada série. Tudo vamos fazer para mudar as coisas neste panorama negativo do futebol português.
António Pereira
O “MOURINHO DOS POBRES”
António Pereira vai voltar a assistir ao próximo jogo para a Taça sentado na bancada que é destinada ao público. O treinador do Atlético Clube de Portugal encontra-se suspenso por ter declarado para a imprensa que “o futebol é um ninho de chulos”, em referência aos empresários que abandonam os jogadores da modalidade. Apesar de ter apresentado um recurso, o castigo manteve-se mas nem isso impediu que o antigo técnico do Montijo e aí apelidado de “Mourinho dos pobres” visse a sua equipa vencer duas importantes batalhas que farão certamente parte da História do Clube.
Há quantos anos dirige esta equipa?
Há um ano.
O senhor António Pereira assistiu ao jogo nas bancadas do Dragão. Segundo foi divulgado, o castigo foi decidido a 18 de Agosto depois de terem sido publicadas declarações suas em que disse que “O futebol é um ninho de chulos”. Segundo apurámos, não se estava a referir à Federação...
Estava-me a referir ao futebol em geral e os senhores da Federação entenderam que era com eles, mas tenho a consciência tranquila.
Referiu ainda que existem “empresários que deixam os jogadores no Atlético e depois é o clube que os tem de alimentar”. Acredita que depois desta vitória alguns deles se tenham arrependido?
Eu referia-me era a alguns pseudo-empresários dos jogadores que os metem aqui e os abandonam. Nós temos alguma “pena” e tentamos solucionar o problema, quando eles se vão embora e os deixam.
Por mais quanto tempo vai durar esta suspensão?
Por mais um jogo.
Vimos na televisão a dona Nazaré Rodrigues, funcionária nesta casa há vários anos, a esfregar o equipamento dos jogadores e a dizer que as camisolas vieram mais sujas do que o habitual do estádio do Dragão. Os seus jogadores suaram como nunca?
Não, suaram normal. Penso que soam sempre da mesma maneira porque também se batem da mesma maneira em todos os jogos.
O senhor já foi referenciado como o “Mourinho dos pobres”, porquê?
Isso não tem nada a ver comigo, foi uma brincadeira entre amigos onde eu moro e que deriva de eu fazer campeonatos e perder poucos jogos. Talvez me tenham apelidado disso porque o Mourinho também perde poucos jogos, mas não tem nada a ver!
Com que palavras costuma deixar a sua equipa antes do jogo?
Não deixo nenhuma frase especial, falo-lhes normal para todos os jogos como irei falar para o próximo.
AS CORES DA ESPERANÇA
Emoção. O jogo pela Taça de Portugal é sempre intenso, em especial para as equipas da Segunda Divisão B e da Terceira Divisão que têm assim a oportunidade de jogar contra clubes mais profissionais da SuperLiga e da Liga de Honra. Nestas batalhas, a desforra entre os pequenos e os grandes é acima de tudo uma aprendizagem e uma oportunidade, mas por vezes os miúdos derrubam os graúdos e por sorte ou por saber, a verdade é que a auto-estima do vencedor se eleva a um nível que lhe dá forças para vencer.
“Vencer, vencer, vencer!”
O hino do Atlético Clube de Portugal foi cantado nas televisões e nas rádios nacionais e fez correr muita tinta nos principais jornais de desporto e de informação generalista. O brasileiro David tornou-se célebre por ter derrubado Golias, o Dragão!
No dia 21 de Janeiro, o estádio da Tapadinha encheu-se com cerca de 2000 pessoas, sócios e simpatizantes do Atlético que esperavam ansiosamente ver a equipa ganhar ao Santa Clara. Os jogadores iam preparados para uma missão complicada e António Pereira declarou mesmo ao Jornal do Bairro que não podia prever o futuro mas prometeu “fazer o melhor possível, vamos com certeza trabalhar muito para conseguirmos um resultado satisfatório”. E conseguiram! A equipa açoreana que não era pêra doce acabou por se revelar deliciosa quando, aos 85 minutos, Artur Vicente – antigo jogador do Santa Clara - marcou um penalty que garantiu a vitória.
No próximo dia 10 de Fevereiro, o Atlético volta a ser grande e recebe em casa a equipa Académica de Coimbra. Como se diz no futebol, “prognósticos só no fim do jogo”, mas ainda que nem tudo sejam flores, o Atlético já cumpriu uma grande missão, a de sobreviver aos anos e a muitos abandonos e a de mostrar que vive, que é grande, que existe e continuará a existir ali no alto como uma estrela que por mais que esteja fragilizada ainda pode alumiar a capital!
Força, Atlético!
M.A.