12.4.07

O “Meu” 25 de Abril

Passados todos estes anos sobre o 25 de Abril de 1974, parece-me fácil reflectir sobre a data, sem paixão ou ódio, euforia ou desânimo, saudosismo ou hostilidade. Hoje, é com relativa objectividade que recordo a efeméride, numa perspectiva desinibida, calma e, de alguma maneira, distanciada.
Eu penso situar-me num campo de ideias, em que não existem profissões de fé ou de ortodoxia, o que não impede que considere o 25 de Abril como uma data histórica bastante importante, talvez a mais importante do século XX português. Por isso, presto aqui a homenagem ao 25 de Abril, que não é de militares ou de civis, de radicais ou de moderados; pertence, isso sim, à História da luta contra a Tirania, não obstante as adulterações, as apropriações, as palavras ocas e os lugares comuns, com que habitualmente é comemorado.
Nós, aqueles que viveram naquele tempo de opressão e insegurança que durou até Abril de ’74, sempre à espera da presença obsessiva e indesejada de censores, inquisidores, polícias do espírito e do corpo, torcionários, bufos, tiranetes, patrioteiros e outras outras espécies que, parecendo estar extintas, se encontram, muito provavelmente, em hibernação…
Nós, aqueles que guardam, nostálgica e amorosamente, nos armários da memória, as bandeiras, as palavras de ordem, o poder da Imaginação e a Imaginação ao Poder…
Nós, aqueles que viveram tudo isso, pensamos que estes anos de Abril vieram redimir uma História de Portugal não tão mítica, não tão exemplar e imaculada, como o querem todos os irredutíveis de todos os quadrantes, de todas as situações, de todas as cores políticas e filosóficas…
Para mim, e para tantos outros:
- O 25 de Abril é não vermos crianças e jovens fardados, fazendo a saudação totalitária, marchando, cantando e rindo, ao som de hinos chauvinistas, militaristas e obsoletos.
- O 25 de Abril é não ouvirmos vociferar que estados, povos e nações são “nossos”, nem que seja pela força das armas.
- O 25 de Abril é podermos inundar as ruas, protestando, apoiando, atacando, cantando e rindo, sem termos cravados na carne e na alma, o ferrete de qualquer organização “patriótica” ou vivermos à sombra paternalista e tutelar do Tirano de serviço.
- O 25 de Abril é podermos ser “contra”, sem por isso sermos perseguidos, marginalizados, expulsos, exilados, detidos, vilipendiados, humilhados, ofendidos, torturados, assassinados.
- O 25 de Abril é sermos donos dos nossos destinos, não obedecermos a padrões impostos. É defender ideais, é ser, estar, ir, intervir, julgar, defender, atacar sem sermos alvo de intimações, inquéritos, proibições e obrigatoriedades.
- O 25 de Abril é não termos medo de ouvir, ver, falar, escrever, ler, emitir opiniões. É, inclusivamente, sermos contra o próprio 25 de Abril.
Insegurança, desemprego, mediocridade, “antigamente era melhor”, capitalismo selvagem, neoliberalismo, “o Ditador é o maior Português de sempre”, cultura “pimba”, geração rasca, inversão de valores, são só a lógica outra face da mesma moeda. São, parafraseando o Poeta, as malhas que a Democracia tece!
E, depois, é tão bom pegar no jornal, ler o livro, ver o filme, ouvir o cantor, admirar o actor, sem deparar com a aviltante e humilhante advertência “Visado pela Comissão da Censura”.
Só por isto mereceu a pena Abril. E é por isso que, não temendo proferir um estafado lugar comum, eu continuarei a dizer:

“25 DE ABRIL SEMPRE”

Fernando J. Almeida

Sem comentários: