29.3.07

À Volta da Cruz das Almas

Só uma vez vi patente ao público, não sei se ao culto, a Ermida da Cruz das Almas, já com a fachada degradada que hoje ostenta. Como já decorreram algumas décadas, a minha memória nada reteve do seu interior.
A Ermida da Cruz das Almas fica situada na Rua de Campolide, junto ao cruzamento formado pelas ruas do Arco do Carvalhão, Campolide e Amoreiras. O templo é uma ermida, o que significa que, na época da sua construção, se situava num ermo e era o local de passagem dos peregrinos que demandavam os santuários, existentes nos arredores.
Os dicionários indicam-nos que “ermida” é uma pequena igreja, isolada do povoado, num ermo e a igreja em apreço ficava situada “fora-de-portas”, ou seja, fora dos limites (portas) da cidade de Lisboa, que se quedavam junto à Estrada da Circunvalação (actual Rua Maria Pia). Cruz das Almas e Campolide ainda eram, em finais do século XIX, uns lugarejos da Freguesia de São Sebastião da Pedreira – meio rural, meio urbana – partilhada pelo Concelho de Lisboa e pelo então existente Concelho dos Olivais.
A Ermida da Cruz das Almas era uma das paragens dos romeiros que faziam a sua peregrinação aos santuários do Senhor da Serra e Senhora de Santana, locais de devoção, romaria, arraiais e festa rija. A História e a topografia situam a Igreja junto aos Arco e Alto do Carvalhão, o que nos remete para o século XVIII, pois “Carvalhão” era a alcunha dada pelo povo ao Marquês de Pombal, de seu nome completo Sebastião José de Carvalho e Melo.
Naqueles tempos, a maior parte do território da actual Freguesia lisboeta de Campolide era zona rural, com as suas hortas, olivais, latadas e searas; aliás, Campolide terá como origem etimológica “campo da lide”, isto é, campo da faina (agrícola). O cereal era ceifado e depois moído nos muitos moinhos que então laboravam e que deram origem aos topónimos Rua e Calçada dos Sete Moinhos; o mesmo cereal acabava transformado em pão na Panificação, situada no mesmo edifício da centenária Sociedade Filarmónica “Os Alunos de Apolo”, em Campo de Ourique.
Em finais do século XIX e princípios do XX, o avassalador avanço da capital fez desaparecer a bucólica paisagem de antanho e a Ermida da Cruz das Almas acabaria envergonhadamente escondida entre o casario que a veio cercar.

Fernando J.Almeida

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